terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Sem saber "Em que esquina ela irá me beijar?"

Nossas despedidas nem sempre são tristes, mas, mesmo assim, não devemos deixar de depositar certa dose de emoção nos gestos e palavras. Afinal, cada despedida pode ser a última. Não pretendo ser fatalista, mas devemos reconhecer que a morte sempre está a nos observar com um olhar sorrateiro esperando por qualquer deslize.
Portanto defendo que devemos estar sempre de bem com as pessoas, principalmente as que amamos. O ideal seria que cada desentendimento fosse resolvido de imediato, pois mágoas guardadas algumas vezes podem abrir espaço para remoermos sentimentos ruins em momentos de reflexão. Cultivarmos relações saudáveis para não haver possibilidade de lamentarmos eternamente assuntos mal resolvidos com alguém que se foi.
Trata-se de um assunto delicado. Pode assustar um pouco ler sobre isso, mas a verdade é que é muito chato estarmos de mal com alguém cuja amizade é preciosa.

Raul Seixas foi um dos que falou sobre a morte e seu poder de deixar assuntos inacabados na canção "Canto Para Minha Morte", cuja letra é a seguinte:


Eu sei que determinada rua que eu já passei
Não tornará a ouvir o som dos meus passos.
Tem uma revista que eu guardo há muitos anos
E que nunca mais eu vou abrir.
Cada vez que eu me despeço de uma pessoa
Pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela última vez
A morte, surda, caminha ao meu lado
E eu não sei em que esquina ela vai me beijar

Com que rosto ela virá?
Será que ela vai deixar eu acabar o que eu tenho que fazer?
Ou será que ela vai me pegar no meio do copo de uísque?
Na música que eu deixei para compor amanhã?
Será que ela vai esperar eu apagar o cigarro no cinzeiro?
Virá antes de eu encontrar a mulher, a mulher que me foi destinada,
E que está em algum lugar me esperando
Embora eu ainda não a conheça?

Vou te encontrar vestida de cetim,
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho
Que eu quero e não desejo,mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida

Qual será a forma da minha morte?
Uma das tantas coisas que eu não escolhi na vida.
Existem tantas... Um acidente de carro.
O coração que se recusa abater no próximo minuto,
A anestesia mal aplicada,
A vida mal vivida, a ferida mal curada, a dor já envelhecida
O câncer já espalhado e ainda escondido, ou até, quem sabe,
Um escorregão idiota, num dia de sol, a cabeça no meio-fio...

Oh morte, tu que és tão forte,
Que matas o gato, o rato e o homem.
Vista-se com a tua mais bela roupa quando vieres me buscar
Que meu corpo seja cremado e que minhas cinzas alimentem a erva
E que a erva alimente outro homem como eu
Porque eu continuarei neste homem,
Nos meus filhos, na palavra rude
Que eu disse para alguém que não gostava
E até no uísque que eu não terminei de beber aquela noite...

Vou te encontrar vestida de cetim,
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho que eu quero e não desejo,
mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida.


Este texto foi escrito por mim em 22 de janeiro de 2009, de noite sozinho em casa, sozinho no meu quarto.

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